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A VIDA DISTANTE DO NORTE:
UMA PERSPECTIVA TEÓRICO-INFORMATIVA SOBRE O PARAÍSO

Hedonic compass
“Se alguém lhe oferecer uma pílula que o torne permanentemente feliz, esteja bem avisado para fugir depressa e para bem longe. A emoção é uma bússola que nos diz o que fazer, e uma bússola com a agulha perpetuamente presa apontando para o Norte é inútil”.
Professor Daniel Gilbert
Departamento de Psicologia, Universidade de Harvard

“A primeira circunstância que abre caminho para o mal é aquela disposição ou organização da criação animal pela qual tanto a dor como o prazer são empregados para estimular todas as criaturas à ação e para torná-las atentas à grande tarefa de autopreservação. Mas o simples prazer, em seus diversos graus, parece, ao entendimento humano, suficiente para esse propósito. Todos os animais poderiam muito bem permanecer em um estado de gozo contínuo e, ao serem instalados por alguma das necessidades da Natureza, tais como a sede, fome e o cansaço, poderiam sentir, em vez de dor, uma diminuição do prazer que seria suficiente para levá-los a buscar o objeto necessário à sobrevivência. Os seres humanos perseguem o prazer tão avidamente quanto evitam a dor; ou, pelo menos, poderiam ter sidos construídos para agir desse modo. Parece, assim, que seria perfeitamente possível dar prosseguimento a todas as atividades necessárias à vida sem que a dor jamais interviesse. A que se deve, então, o fato de os animais estarem sujeitos a uma tal sensação? Se lhes é possível viver uma hora sem ela, eles poderiam muito bem gozar de uma isenção perpétua [...].”
David Hume (1779)
Diálogos Sobre a Religião Natural (São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1992)

Muitos milhões de pessoas no mundo contemporâneo estão com a agulha da bússola permanentemente “presa ao Sul”. Apresentam-se sempre infelizes e descontentes, tendo de suportar dores crônicas e/ou depressão. De fato, vítimas de uma grave anedonia não são nem mesmo capazes de imaginar o que é ser feliz. Uma “benção menor” seria o fato de que nem todos os seus dias são tão terríveis: uns são menos que os outros. Assim, em um sentido, sua bússola emocional pode apontar tanto para o Norte quanto para o Sul: um sistema motivacional do tipo que ainda funciona. Porém, em geral, passam suas vidas num deserto ártico de tristeza e desespero.

No outro extremo, uma pequena minoria de pessoas é agraciada com uma bússola que está perenemente apontando para o “Norte”. No que tange aos casos patológicos, tais pessoas poderiam ser consideradas maníacas. Todavia, às vezes, elas só estão em diferentes graus de “hipertimia”, i.e., quando o set-point hedônico no qual suas vidas oscilam é extraordinariamente alto se comparado ao padrão darwiniano. O bem-estar hipertímico é algo crônico; embora não seja uniforme. Assim, certos dias da vida hipertímica são ainda mais maravilhosos do que outros; de fato, tentar desenvolver suas atividades favoritas faz com que os hipertímicos alegrem-se mais ainda. Novamente, a bússola emocional hipertímica é bidirecional: sua escala é diferente, porém funciona. O contraste relevante jaz no modo segundo o qual os hipertímicos são animados por gradientes de bem-estar informativo-sinalizadores [information-signalling], ao passo que distímicos, depressivos e vítimas de dores crônicas passam suas vidas lutando para minimizar seu mal-estar. De qualquer forma, a situação se encontra sob o jugo dos gradientes afetivos.

As pessoas ditas “normais”, ou “eutímicas”, estão inclinadas a crer que hipertímicos/“otimistas” veem o mundo através de “lentes cor de rosa”. De fato, o seu sistema de processamento central de informações é estruturalmente tendencioso. Por outro lado, os hipertímicos depreendem o resto de nós como sendo excessivamente pessimista. Por sua vez, depressivos crônicos são passíveis de perceber pessoas eutímicas ou hipertímicas como estando iludidas. Deveras, vítimas de depressão melancólica podem sentir como se o próprio mundo fosse odioso e sem sentido. Devido a razões evolutivas (cf. rank theory), uma predisposição genética à hipertimia ou à mania eufórica unipolar é mais rara do que à distimia ou depressão unipolar. A maior parte de nós encontra-se em algum lugar entre esses extremos temperamentais, ainda que a distribuição esteja mais inclinada ao polo sul do eixo. Além disso, a genética desempenha um papel chave na determinação de nosso set-point hedônico, assim como a interação incessante entre nossos genes e estressores ambientais. Uma dieta inadequada, o uso improvidente de drogas, bem como um grave, crônico e descontrolado estresse, são capazes de redefinir o termostato emocional a um nível inferior a sua norma prévia – muito embora tal norma possa ser surpreendentemente forte. Diferentemente de euforizantes recreacionais, antidepressivos de ação tardia podem restaurar um set-point reduzido [lowered] à sua norma precedente, ou até mesmo aumentá-la. Ademais, antidepressivos podem agir de modo a reverter a hipertrofia induzida por estresse da amígdala basolateral, bem como contrastar com a atrofia dendrítica induzida por estresse no hipocampo. Entretanto, nenhum estimulante de humor que atualmente encontre-se licenciado para o tratamento da depressão é capaz de induzir de forma segura a felicidade permanente, seja esta informativo-sinalizadora ou constante, calma ou maníaca. Em última instância, um limite geneticamente determinado barra a nossa qualidade de vida de aprimorar-se como um todo.

Estaria o futuro dos ânimos e das motivações no universo destinado a ser uma repetição interminável da vida evolutiva passada? Estariam os mesmos filtros afetivos, os quais foram geneticamente adaptados aos nossos ancestrais hominídeos, aptos a serem conservados por nossos sucessores transumanos? Será que as formas de vida superinteligentes realmente optariam por preservar de modo indefinido a arquitetura de uma esteira hedônica primitiva? Em qualquer um dos casos, provavelmente não, embora seja controverso se drogas projetadas, neuroeletrodos, ou terapias genéticas, de fato, terão o maior impacto na recalibração do eixo prazer/dor. Em longo prazo, talvez a engenharia genética de células germinativas resulte em um maior aumento global do bem-estar emocional que se possa imaginar. Isso já é demonstrado pela iminência de uma revolução reprodutiva de bebês projetados. Ainda, graças à medicina genômica, os pais de amanhã poderão escolher a composição genética, bem como a personalidade de seus filhos. De maneira crítica, os futuros progenitores serão capazes de selecionar a configuração emocional de sua prole, ao invés de simplesmente jogar roleta russa. Ao decidir que tipo de filhos irão criar, (presume-se que) os pais do porvir muito dificilmente optarão por crianças disfuncionais, depressivas ou tomadas pelo mal-estar. Mas para além das implicações éticas da utilização do antigo código corrompido, de fato, crianças de temperamento alegre, carinhosas e afetuosas são muito mais agradáveis de serem criadas e educadas.

A consequência coletiva das escolhas genéticas individuais feitas por esses pais será muito mais abrangente. No decorrer da nova era das biotecnologias avançadas e da medicina reprodutiva, talvez uma combinação de fármacos projetados, terapias genéticas autossômicas e intervenções germinativas possibilite a uma civilização habitar um espaço de estado localizado emocionalmente mais ao “Norte”. Ou seja, “mais ao Norte” daquilo que os humanos de hoje em dia são capazes de imaginar ou descrever de forma coerente. Ademais, os gradientes de felicidade hereditária perpétua são passíveis de acabar se tornando ubíquos. Assim, os mais baixos e piores estados pós-humanos poderiam ser muito mais ricos do que a mais sublime das experiências de pico atual. De modo menos intuitivo, nossos descendentes super-saudáveis podem vir a ser constitucionalmente mais inteligentes, assim como mais felizes do que os humanos não aperfeiçoados. Auxiliados por tecnologias de aprimoramento sintético, os gradientes de textura fina de um bem-estar emocional intenso podem assumir um papel informativo-sinalizador, no mínimo tão versátil e sofisticado quanto os gradientes de bem-estar emocional e de sensações de dor hodiernos. De maneira mais simplista, poder-se-ia dizer que a posteridade será “permanentemente alegre”. Todavia, essa expressão pode ser um pouco enganosa, pois é improvável que os pós-humanos tornem-se usuários de wirehead “extasiados” ou dependentes de soma transtornados. Ao invés disso, poderíamos navegar pelos gradientes de uma bússola multidimensional projetada – ao contrário de sua predecessora darwiniana repleta de erros – por agentes inteligentes com vistas a seus próprios fins.

Teoricamente, pode ocorrer de não haver necessidade de qualquer imersão informativo-sinalizadora no bem-estar subjetivo. Isso se daria devido ao fato de que, tanto o lado desagradável quanto o simplesmente medíocre da vida, poderiam, em princípio, ser computacionalmente descarregados em nossas máquinas inteligentes e próteses neurais. Em suma, há a necessidade de possuir uma bússola somente até se alcançar o destino final; é algo redundante. Contudo, a possível existência de um Ultima Thule cósmico, cuja consecução eventualmente tornaria uma bússola desnecessária, é mera conjectura. Deveras, assim também será com a natureza da arquitetura motivacional da vida provisória ao longo dos próximos bilhões de anos. De maneira menos ambiciosa, para que os seres humanos encarem a abolição do sofrimento, ou mesmo o advento da Engenharia do Paraíso, não é preciso assumir que nos tornaremos ciborgues desenvolvidos, faremos o upload de nós mesmos, ou buscaremos alcançar qualquer uma das mais exóticas possibilidades disseminadas pelos transumanistas. Para isso acontecer, basta que recalibremos as configurações genéticas que regulam o nosso tom hedônico basal.

Outrossim, é certo que um sistema motivacional hipotético baseado inteiramente em gradientes adaptativos de felicidade equivaleria a uma imensa transição na história da vida do universo. Porquanto sua consecução caracterizaria uma revolução ética sem precedentes. Porém, muito mais tecnicamente desafiador e especulativo, será o planejamento genético de novas emoções e da “reencefalização” das antigas. Pois, o nosso sistema natural informativo-sinalizador evoluiu para servir aos interesses de um DNA egoísta. Como alternativa, os hipotéticos sistemas informativo-processadores futuros poderiam ser dedicados aos interesses dos “veículos” sencientes do DNA. Entretanto, tal revolução talvez nem possa vir a ocorrer. Bioconservadores de todos os tipos discordam por princípio das tentativas de redesenhar a natureza humana. Eles consideram a abolição do sofrimento, e a perspectiva de um aprimoramento hedônico radical, como sendo, na melhor das hipóteses, uma espécie de utopismo romântico. Os bioconservadores seculares acreditam que deveríamos manter o mesmo núcleo biologicamente predestinado de emoções básicas assim como nossos ancestrais desde tempos imemoráveis. Em suma, a vida humana deveria continuar atuando em torno do mesmo “set-point” hedônico/doloroso que funcionou como um tipo de melhorador de fitness no ambiente ancestral da savana africana. Por seu turno, bioconservadores cristãos creem que deveríamos preservar a natureza humana, pois o Homem foi criado à imagem de Deus. Se assim for, então o melhor que poderia ser dito é que ainda não refletimos muito bem sobre Deus.

Seja bem-intencionado ou não, o bioconservadorismo é uma receita para a perpetuação de um ciclo interminável de infelicidade e dores satânicas. Se a Mãe Natureza realmente se importa conosco, então poderia ser o caso de nos deixar em paz, assim como os bioconservadores desejam. Mas em última instância, tal antropomorfismo é moralmente frívolo: ele reflete uma completa falta de urgência moral frente à terrível propensão hereditária ao sofrimento endêmico da vida orgânica. E uma falta de urgência moral também com relação ao imperativo ético para curá-lo através dos únicos meios possíveis, ou seja, as biotecnologias avançadas. Nosso repertório primitivo de emoções, e a funesta calibração de nossa esteira hedônica, persistem até hoje apenas porque auxiliaram nossos genes a deixar mais cópias de si mesmos [“maximizando seu fitness inclusivo”], durante o período pré-moderno, quando a vida humana realmente era rubra nos dentes e nas garras. Com um pouco de sorte, a pressão de seleção na era porvir da seleção “não natural” favorecerá um conjunto de adaptações, o qual será radicalmente diferente dos traços adaptativos mais desagradáveis de nosso passado darwiniano. Pois, assim que dermos um fim à seleção natural, a evolução não será mais “cega” ou “aleatória”. Dessa forma, os possíveis pais de amanhã serão agentes quase-racionais, capazes de escolher os futuros genomas em antecipação de suas prováveis consequências comportamentais. Uma variedade mais benevolente, porém não menos intensa, de pressão de seleção estará em atividade. Tal tendência só acelerará com a conquista do envelhecimento ao longo dos próximos séculos. Assim, conforme a Terra atinja sua capacidade máxima de quase-imortais, a reprodução precisará ser meticulosamente planejada.

A saúde mental pós-darwiniana/pós-humana, ao final do terceiro milênio, provavelmente será muito mais rica do que sua precursora empobrecida do século XXI. De fato, de acordo com os padrões de nossos sucessores iluminados, seres primitivos repletos de mal-estar emocional, como nós, serão considerados como estando sob o domínio de uma psicose afetiva tóxica. Digamos que, fantasiosamente, seu anjo da guarda lhe ofereça uma pílula capaz de torná-lo eternamente feliz, então talvez você seja louco, de certa forma, se disser não. Infelizmente, a natureza da psicose afetiva impede uma visão completa acerca dessa condição. Assim, alguém poderia hesitar em tomar a pílula. Críticos como o Professor Gilbert estão prontos para lembrá-lo de que você já está bem avisado sobre “fugir depressa e para bem longe” dos traficantes de qualquer espécie de poção de felicidade vitalícia.

Ironicamente, se você sucumbir à mercadoria do traficante de pílulas do prazer, então, como um bônus incidental à prometida felicidade vitalícia, você realmente será capaz de correr mais rápido e para bem mais longe em qualquer direção que quiser. Pois, um grande bem-estar comumente aumenta a motivação, a força de vontade e a capacidade de antecipar a recompensa. Ademais, amplificar a função da dopamina mesocorticolímbica também aumenta o alcance dos estímulos que um organismo julga recompensadores. De maneira contra-intuitiva, se o enriquecimento hedônico for realizado sensatamente, então a bússola emocional funcionará melhor. O enriquecimento hedônico reverterá o monótono e desolador desespero comportamental que aflige as vidas dos depressivos – e seus análogos subclínicos menos graves dos humanos darwinianos ditos “normais”. Deveras, o bem-estar aprimorado é fortalecedor, além de ser potencialmente capaz de libertar os pós-humanos dos grilhões bioquímicos do ancien régime. Em princípio, o bem-estar aprimorado pode ser intensamente compassivo e empático. Outrossim, o enriquecimento hedônico avulta o amor pela vida e o estímulo de autopreservação: um panorama que contrasta com o desespero niilista da depressão maior. Por conseguinte, no futuro, uma mentalidade hereditariamente feliz provar-se-á geneticamente adaptativa se as combinações genéticas/alélicas projetadas que a promovem demonstrarem-se atrativas aos possíveis pais.

Entretanto, poderia um sistema informativo-processador, o qual opera sobre gradientes de felicidade vitalícia, ser realmente capaz de sustentar uma perspectiva crítica? Em princípio, ao menos, sim. Os análogos funcionais do realismo depressivo podem ser conservados sem as texturas desagradáveis do mau humor. Uma formulação mais incisiva utilizada às vezes para definir “informação” é a de que esta é “uma diferença que faz a diferença”. Nessa base, o que importa no contexto do paradigma teórico-informativo não é nossa posição absoluta sobre o eixo prazer/dor, mas sim a nossa sensibilidade diferencial às variações emocionalmente assinaladas nos estímulos relevantes de fitness. Pois nesse futuro vaticinável, uma bússola emocional será necessária para guiar os psicologicamente super-saudáveis no paraíso pós-darwiniano habitual, não menos do que no purgatório darwiniano moderno. Os esquemas de código binários do eixo prazer/dor são enormemente econômicos no que tange esse fim navegacional. A diferença em voga aqui é a de que, em breve, estaremos em uma posição apta a domar suas cruezas truncando o eixo em seu final desagradável ao estender amplamente seu alcance até a nova versão. Um sistema motivacional aperfeiçoado não é apenas tecnicamente viável, seus contornos hipotéticos serão bem mais agradáveis para o utilizador final. Com efeito, nossas capacidades navegacionais serão igualmente ampliadas de modo vasto.

Talvez uma analogia fictícia não seja inadequada aqui. Para complementarmos uma pílula imaginária da felicidade vitalícia, consideremos a proposta de uma pílula capaz de induzir a hilaridade permanente. Tal pílula não é (tão) fantástica quanto possa parecer. Em 1998, neurocientistas da Escola de Medicina da Universidade da Califórnia descobriram o que poderia ser chamado de “centro do humor” no cérebro, apesar dos infelizes ecos da frenologia. Aparentemente, a base neural do humor encontra-se em uma pequena região da área motora suplementar esquerda. Se esta for eletricamente estimulada, o indivíduo em questão não somente irá gargalhar, mas considerará tudo irresistivelmente engraçado – assim como o usuário de wirehead da ficção científica acha tudo indiscriminadamente prazeroso. Em princípio, uma vez que a assinatura neurológica do humor puro seja identificada, então seus substratos moleculares poderiam ser ampliados para além de tudo o que a seleção natural projetou até agora. Essa ampliação pode ocorrer através do consumo de pílulas, utilização de neuroeletrodos ou modificação genética. De modo fantasioso, poder-se-ia até mesmo imaginar uma civilização reprogramada, cujos habitantes, devido sua própria natureza, julgam tudo aquilo que veem como sendo hilariantemente cômico. Todavia, intuitivamente, aqueles que acham tudo engraçado são incapazes de demonstrar qualquer senso crítico. Pessoas que seriam promiscuamente distraídas por qualquer comédia pastelão ou trocadilhos terríveis não menos do que por uma inteligência literária sublime. Por conseguinte, caso valorássemos o senso de humor sofisticado, então não seríamos tentados pela oferta de uma pílula que nos deixaria indiscriminadamente entretidos – assim como poderíamos fugir depressa e para bem longe do oferecimento de uma pílula capaz de nos deixar indiscriminadamente felizes. Pois, por exemplo, alguém poderia desejar reagir e corresponder apropriadamente a um ambiente em mudanças – em algum sentido de “apropriado” tido como mal definido. Porém, se uma sociedade avançada que valora o humor quisesse tornar sua vida eternamente divertida, e seus membros ainda objetivassem preservar seu senso crítico e a busca por fontes de humor cada vez mais ricas, então não haveria nada que pudesse impedi-los de manter o papel informativo-sinalizador dos gradientes de hilaridade ao simplesmente recalibrar a configuração neurológica inicial de sua escala de humor. Dessa forma, estaria apta a surgir uma civilização pós-humana cujas maiores preocupações seriam subjetivamente mais hilariantes do que os nossos momentos mais engraçados de comédia.

Naturalmente, o exemplo apresentado acima é grotesco. Isso não ocorreria nem mesmo se fosse uma opção neurologicamente viável em termos de matéria de teste em um laboratório experimental. Certamente, generalizar a possibilidade de aprimoramento do humor biológico para uma sociedade inteira é pura fantasia – de qualquer forma, segundo o nosso conhecimento. Em comparação com a urgência de abolir o sofrimento, acabar com a ausência de senso de humor individual [humourlessness] nem mesmo faz parte de nosso radar moral.

Entretanto, não devemos subestimar a versatilidade de uma bússola biologicamente bem projetada. Hoje em dia, a vida senciente na Terra segue uma economia informacional mental conduzida por gradientes de descontentamento. Ao passo que, amanhã, teremos a opção de uma economia informacional mental guiada por gradientes de bem-estar.

Então, seria errado tomar a pílula?

* * *

Original Title: Life in the Far North: An information-theoretic perspective on Heaven
Brazilian Portuguese Title: A vida distante do norte: Uma perspectiva teórico-informativa sobre o paraíso
Author: David Pearce (2005)
Technical Review by: Lauren de Lacerda Nunes (2012)
Translated by: Gabriel Garmendia da Trindade (2012) see too 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 & 11

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